segunda-feira, fevereiro 28, 2011

A simplicidade da vida moderna


- Vamos falar com o papai no computador.
- Papá, papá!
- Conexão não identificada? Peraí…
- Papá, papá!
- Será que é esse o cabo da internet...
- Mamma, mamma!
- Taz fica lá em cima! Aqui é uma área restrita a adultos.
- Uéééééé!!
- Não chora que já arrumei. Chama o papai.
- Papá, papá!
- Oi amore! Amor? Oiiiiiii, tá me ouvindo?
 - Paft, paft, paft!
- Que mensagem é “problemas com o dispositivo de gravação” ?  
- Paft, paft, paft!
- Taz, para de bater no teclado.
- Paft, paft!!
- Acho que é o microfone. Vai brincar um pouquinho no chão, vai.
- Non, non!!
- Vamos tentar de novo. Amor, tá me ouvindo?
- Sim, mas não te vejo bem. Tem de configurar a webcam.
- Onde é? Arquivo, visualizar, ferramentas...
- Ferramentas. Isso. Agora mexe no foco.
- Ainda essa.  Melhorou?
- Ótimo, cadê o Taz?
- Tá aqui.
- O que tá fazendo?
- Ele está... não aperta esse botão filho!
- Puf!             

sexta-feira, fevereiro 25, 2011

Férias Individuais



Você que está chegando ao blog pela primeira vez não se assuste com algumas declarações que estou pra fazer. Digo isso porque outro dia li um comentário no twitter de uma mocinha que lera alguns dos meus posts. Ela se dizia chocada, quase horrorizada com a maneira como eu descrevia a vida de casada. Confesso que me senti um pouco culpada. Será que estou sendo muito malvada, cínica, uma destruidora de lares pintados de coraçãozinhos cor-de-rosa?

Pus-me como uma visitante e tentei ver com outros olhos os textos publicados. A primeira coisa que se lê logo após o título (uma pergunta arguta, profunda) não é um bem-vindo, mas um aviso sobre o destinatário dessas confidências. Prevenido, o leitor arrisca a dignidade se quiser. Acho justo não ofender a sensibilidade alheia. E injusto é bisbilhotar no proibido e se ultrajar como uma virgem desonrada.

Com essa reflexão espanei pra longe qualquer poerinha de culpa. Poderei, assim, voltar às minhas infâmias esperando que a sutileza da ironia caia n’alma dos mais sagazes. A provocação de hoje é: todo casal merece tirar férias um do outro.  Quando a fase do “não respiro sem você” já passou e paciência vira uma palavra que se arrisca num precipício, adquire-se o direito de gozar um período longe do cônjuge.  Pode ser visto com um prêmio de consolação pelo estresse suportado o ano todo, mas não necessariamente uma licença para a libertinagem.

É um afastamento temporário do convívio conjugal para meditar, se divertir com as amigas, rever a família, sem o peso do acompanhante. Eu sei que parece um pouco drástico, mas é difícil para algumas mulheres conseguir se repousar e restabelecer o equilíbrio mental e físico carregando a mala de papelão sem alça, cheia de pedra e molhada da chuva.

Minha amiga V. há um marido que é um poço sem fundo de intolerância. Nos primeiros anos de casada quando toda a família ia para a praia, ele se lamentava das filas, dos ambulantes, dos outros turistas e  as brigas passavam do garçom para os pernilongos numa irritabilidade infinita. Um troca-troca de cadeiras no escritório, e  seu chefinho atual não lhe dá férias coincidentes com as da minha amiga. Oh, que maldade!

Então amiga, não me tome como leviana. Uns dias só com você mesma faz um bem danado ao relacionamento.

quarta-feira, fevereiro 23, 2011

A origem de uma idéia




Retornei. É por demais previsível, mas não resisto a contar como é viajar com o pequeno Taz durante nove horas seguidas. Tenho a impressão que ele vive em outra realidade temporal. Apenas trinta minutos depois de partirmos, já tinha acontecido tudo o que era esperado pelo percurso todo. Em pouco tempo passou do êxtase pleno com as novidades da sua primeira viagem, ao aborrecimento absoluto quando percebeu que não dormiria no seu cafofinho.

 E nesse ínterim, testou a solidez dos vidros e funcionamentos das botões tantas vezes que deixaria no chinelo um técnico do Inmetro. Tornou-se conhecido entre os passageiros pelos seus grunhidos tazmanianos, perdeu o interesse rapidinho por todos os apetrechos eletrônicos e luminosos que trouxe na bolsa e passou os cinco dedos na merenda de outro menino.

Após três horas de combate cedeu ao sono. E eu pude aproveitar para ver um filme. “A Origem” concorre ao Oscar de roteiro original por contar a história de um homem que tenta implantar na cabeça de outro homem uma ideia. Pensei cá comigo: até aí a originalidade se restringe aos personagens masculinos. Por que? Há muito que as mulheres são versadas na arte de fazer com que os maridos pensem que a iniciativa partiu deles. (Pensou que eu não conseguiria pegar uma carona no tema pra falar mal deles. Ledo engano!)

A técnica é aprimorada com o tempo e nasce invariavelmente da necessidade de manter a paz no seio da família e garantir ao homem a patente de comandante da relação. É usada nas mais inusitadas situações, mas sempre com o mesmo objetivo: criar uma situação aparente em que ele pense ter tomado uma decisão exclusivamente sua.

- Querido, não precisa nos acompanhar na viagem pra casa da mamãe.
- O prazer não será todo meu.
- Pois é. Vai faltar ao trabalho, se estressar e gastar por nada
            - E as malas...
- A gente despacha todas.
- O Taz?
- . Eu consigo domar nossa ferinha (espelho, espelho meu, quanto convincente pode ser uma mentira?)
- Tem certeza que não precisa de ajuda?
- Amor, sabe que eu me viro muito bem sem você.
- Eu vou e fim de papo.
- Você é quem decide...

segunda-feira, fevereiro 21, 2011

O casamento do meu filho





- Próximo!!
- Ei somos nós.
- Documentos do requerente.
- Aqui.
- Pagou a taxa?
- Sim
- Trouxe as fotos?
- Sim. Fiz tudo direitinho.
- É verdade, meu marido sempre faz tudo direitinho.
- Preencheu o formulário?
- Claro.
- Falta uma informação.
- Não é possível! Qual?  
- Estado cívil.
- Mas é desnecessário…
- O estado cívil meu senhor.
- Mas ele só tem um ano de idade.
- Ou me diz ou vai pro fim da fila.
 -Taz, meu filho, você é casado ou solteiro?
-Dádádádádá!
- Isso responde a sua pergunta?
- Próximo!

Noventa minutos depois...
- Documentos do requerente.
- Aqui.
- Pagou a taxa?
- Sim
- Trouxe as fotos?
- Sim.
- Preencheu o formulário?
- Sim
- Estado cívil?
- Solteiro. Tudo correto agora?
- Ainda falta uma informação.
- O que?
- Nível de escolaridade? 
- Ah, por favor...

quinta-feira, fevereiro 17, 2011

quarta-feira, fevereiro 09, 2011

Triste fim de mim mesma


Uma jornada medonha aguarda ansiosamente para entrar na sua vida. Mas antes ela analisa caprichosamente o período mais oportuno. Descarta aqueles dias em que você está à toa e nada pode abalar sua disposição. Ela escolhe a dedo aquele momento em que você está uma pilha de nervos, não há paciência nem para as gracinhas do açougueiro. Tanto que na primeira piada sobre a maminha você o manda enfiar a carne no buraco de onde ele saiu.

A minha começou às três da madrugada quando fui acordada por uma violenta revolta no meu aparelho digestivo. Estômago e intestino disputavam entre si quem conseguia expulsar mais líquidos do meu corpo. Chegou ao ponto de eu ter de tomar uma decisão sobre qual dos dois teria prioridade no vaso sanitário. Depois de amanhecer abraçada ao rolo de papel higiênico me dei conta de que esse revertério não era culpa só do misto-quente da véspera. Prostrada, esperei as horas passarem.

Há uma vantagem quando você se sente uma lesma rastejando pelo chão. Pensa que nada de pior pode acontecer. Mas eis que a mais inconveniente das criaturas chega ciscando na sua casa e dispara:
- A irmãzinha do Taz está chegando. Olê, olê, olá!!!

A vontade era de destrinchar a ave. Mas é nesse ponto da história que a jornada se torna duplamente medonha. O pequeno Taz também começa a ter vômitos e o primeiro vai parar na bolsa grifada da galinha.



E no pronto-socorro a simpatia em pessoa me examina.
- É uma virose.
- Então não vou morrer?
- Um dia sim.

Às onze horas da noite todos os órgãos do meu corpo tinham sossegado. Um plasil muito mais que bem-vindo me atirava para o mundo dos sonhos e eu me entregava com prazer. Pensou que a merda foi pouca? Foi agora que o pinico transbordou. Do outro lado da cama, um recém-contagiado não conseguiu acordar a tempo e fez a caganeira ali mesmo.

segunda-feira, fevereiro 07, 2011

Alô Doçura! Parte 2 – O Retorno



- Alô!
- Oi! Tá muito ocupado?
- Fala.
- Primeiro responde se tá muito ocupado ou não.
- Como é que vou saber. Depende do que você tem pra falar.
- E o que eu tenho pra te dizer depende de você estar ocupado ou não.
- Já vi que é mais sandice.
- Ser presuntuoso causa impotência.
- Pelo menos não perco meu tempo.
- O que quis dizer com isso?
- Quem tá querendo dizer alguma coisa é você.
- Você pensa que o seu tempo é mais precioso que o meu?
- Claro, eu trabalho.
- E eu não, fico o dia inteiro boiando na internet.
- É uma atividade muito rentável.
- Tá fazendo pouco caso de mim?
- Lá vem você com seus complexos.
- Eu também sou gente.
- Não comece que estou sobrecarregado de trabalho.
- Aha, eu sabia que tava ocupado.
- Em casa a gente conversa.
- Peraí, que eu tenho uma coisa pra te falar.
- Tututututututututututututu!

quinta-feira, fevereiro 03, 2011

A família margarina


Estão todas vivas? Espero que sim. O suicídio em massa depois da matéria da Veja sobre famílias famosas e felizes não passou de um temor excessivo. Também com tanto “f” juntos só poderíamos pensar em uma coisa: falsidade pura. O papai e a mamãe cantando Happy Day logo de manhã cedo enquanto o filho passa margarina no pão é uma cena do imaginário coletivo. Mas está no plano do intangível.

Quando era pequena e via esse comercial na televisão pensava que eu era a única criança do mundo que não tinha um café da manhã extasiante. Na minha casa, o dia começava com meus três irmãos brigando pelos últimos bolinhos, meu pai tentando finalizar as correções das provas dos alunos e minha mãe nos milhares de afazeres domésticos. Sobrando em um canto da cozinha, eu sonhava com a família perfeita.

É uma lembrança nostálgica mas nos faz pensar o quanto somos influenciados por modelos ideais que não passam disso: criaturas do mundo das ideias. Não vivem na nossa realidade, onde acordamos de mau-humor, açodados para trabalhar e pagar as contas. Sim, temos desejos, frustrações, anseios, inveja, mas não vamos permitir que esses sentimentos sejam explorados com a visão da foto de Huck, Angélica e seus dois fofíssimos anjinhos. Amiga, creia no que estou pra te dizer: eles também têm problemas, mas sofisticados que os seus, mas têm.

E quando a tentação é grande em fantasiar com “todos foram felizes para sempre” pense em uma pergunta que uma mulher muito, mas muito inteligente fez para a namorada de George Clooney:
- Diz aí, quando George acorda de manhã tem o mesmo hálito de chacal de todo mundo né?

quarta-feira, fevereiro 02, 2011

Alô Doçura!


- Alô!
- Oi amor!
- Tá me ouvindo bem?
- Claro e limpo como a pureza da minha alma.
- Tem certeza?
- Sim, a linha tá excelente. Dá pra ouvir suas pálpebras piscarem.
- Não quer ir ao terraço onde o sinal pega melhor?
- Desembucha logo.
- Ok. Chegou a conta do celular.
- Como?
- Eu disse que chegou a conta do celular.
- Pera aí. A voz tá cortando.
- Você me ouviu muito bem.
- Piorou. Tem um chiado horroroso. Shiiiiiiiiii!!
- Não banque a espertinha.
- Shiiiiiiiiii!!! Não dá, depois a gente conversa. Shiiiiiiiiii!!!
- Não! Não!
- Tututututututututututututu!

terça-feira, fevereiro 01, 2011

Em busca de uma resposta




Ela atravessou mares, escalou montanhas, enfrentou tempestades de areia no deserto. Quebrou a unha, ficou semanas sem um antitranspirante. Mas finalmente chegou ao Templo Maior.  Lá, encontrou o mais sábio dos monges.
- Mestre, fiz enormes sacrifícios para chegar até aqui. Tenho tantas perguntas.
- Seja breve minha filha, está pra começar a Família Soprano.
- Ok, tenho uma dúvida que me corrói há anos. Por que os homens mudam depois do casamento?
- De novo. Kinabalu, acrescenta mais essa na FAQ (perguntas frequentes) e cola na porta principal.

Muitos anos atrás um velho monge encarregado de matar os bodes do mosteiro para alimentar os seus companheiros cumpria pela última vez essa tarefa. Estava muito doente e logo morreria. Antes que a faca cortasse o animal ouviu uma gargalhada:
- Bicho, por que rides? Você vai morrer.
- Eu sei. É que depois de tantas vezes nascendo como bode e sendo morto por você finalmente vou encarnar como homem. E sabe qual o melhor de tudo?
- Vou morrer e nascerei como bode.
- Não. Você será minha mulher. Hahahahahahaha!!!
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